Conta dona Morena que, o biscateiro e pintor nas horas de “folga” Arlindinho era um sujeito extrovertido, agradável e bem humorado, mas “ligeiramente” metido a esperto. Pois, certa ocasião, de olho no coração da “Tiçoca”, como era conhecida a Cristal Maria, passista da escola de samba do bairro, passou a freqüentar a Igreja Evangélica defronte à pracinha. A loirinha “boa de samba no pé” abandonara o Carnaval para atender o CHAMADO do SENHOR, trocando o pequenino biquíni de lantejoulas por saias de comprimento longo e cabelos sem cortes.
Arlindinho não a acompanhava, porém estava sempre perto da moça a cortejá-la e apresentar sua companhia. Enquanto ELA o convidava para prestigiar o culto, o moço a provocava a ir à roda de samba ou até mesmo comer algum lanche no quiosque do tio Milton. Tanto insistiu que, a bela e, agora recatada Tiçoca, fez-lhe uma proposta: “Se tu me acompanhares no culto especial do próximo domingo, aceito teu convite para tomarmos um refrigerante e comermos alguma coisa no quiosque. Topas? – propôs a moça. Sem titubear, o malandro aceitou na hora. Tinha uma semana para arrumar um “bico” e reservar algum para a função com “sua querida”.
Infelizmente, a semana passou muito depressa e não apareceu nenhuma oportunidade de aumentar a grana disponível na carteira do rapaz. Chegou o domingo e como não poderia perder a oportunidade lá estava Arlindinho ocupando os primeiros lugares do templo, bem pertinho da Tiçoca, digo, irmã Cristal. No meio do culto, entre orações e louvores, surgiu diante do moço o “cesto de doações”. O Arlindinho sacou de seu bolso sua única nota( de R$2,00), olhou para os lados e não percebendo vigilancia de lado algum, substituiu-a por uma de R$20,00. O propósito era justamente “defender” a grana do lanche do casal. Ninguém percebeu o gesto do ágil Arlindo.
Ao final do culto, na saída do templo o casal foi abordado por dois senhores bem apessoados, de porte físico avantajado, bem trajados (um deles carregava uma pequena bíblia numa das mãos) que disseram o seguinte: “Irmã Cristal, por favor, o pastor lhe aguarda na secretaria para combinarem a agenda da semana”. O Arlindinho resolveu acompanhá-la porém, foi impedido quando um dos senhores, de forma firme e forte, o pegou pelo braço anunciando: “O senhor não esqueceu nada no dia de hoje, irmão?” . O moço respondeu negativamente. O homem do terno escuro, além de não soltar seu braço, apertou mais um pouco. “Tem certeza, meu senhor”- afirmou ELE. Nesse momento, seu colega de terno escuro aproximou-se, segurando-o pelo outro braço. Arlindinho, sem muito tempo para pensar, lembrou rapidamente do cesto da doação. Solicitou quase que, instantaneamente, o tal cesto e nele depositou os R$20,00(!). Demonstrando gratidão e devoção, os senhores de ternos escuros foram soltando seus braços, agradecendo e afastando-se lentamente de Arlindo.
Passados quinze minutos, do ocorrido, a irmã Cristal ou Tiçoca (como desejarem) retornou e encontrou o Arlindinho com um semblante entristecido. Foi logo desculpando-se e o convidando para irem ao quiosque do seu Milton. O moço completamente “empobrecido”, pois até os R$2,00 – filho único – haviam sido doados à causa religiosa, decidiu transferir o passeio combinado. Afirmou por fim que, acreditava na aceitação de um novo convite pois não tinha dúvidas que, “a fé move montanhas”. Se não move, pelo menos movimenta as pessoas, de ternos escuros, principalmente.
Arlindinho continua acreditando na existência de uma força superior, porém até hoje não descobriu como e por quem foi flagrado nos primeiros movimentos com o cesto de doação? E a irmã Cristal? Foi transferida. Está evangelizando na região metropolitana da cidade e dificilmente é vista no bairro onde mora.
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