14 de mai. de 2013

13 de maio - Dia de comemorações? "Sei não, meu fio..."



 
 
Meus queridos e minhas queridas,

           Há muito tempo resistia à idéia das oportunidades restritas, do olhar torcido, do "oportunismo(?)" das situações e oportunidades de trabalho disponibilizadas. Coisas desta ordem. Entendia que, quando o indivíduo não colhe bons frutos é porque não semeou como deveria durante o plantio. Enfim, devaneios comuns. Nos últimos 20 anos e, mais precisamente, a partir das leituras, dos estudos, convívio e de um olho diferente para a vida com tudo que aconteceu e aprofundou-se desde a criação do Armazém do seu Brasil as imagens diante dos olhos passaram a ser "ligeiramente" percebidas.
            Longe de tentar ser POLITICAMENTE CORRETO passei a ouvir com ouvidos mais atentos, observar com olhares mais intensos e acolher com mais leveza. Conviver com pessoas como a Vera Daisy Barcelos, Johny Trevisan, Lúcio Almeida Machado, João Paulo Silveira, Grace Tanikado, Silvio Correa, Lizette Castro, Fernando Saraiva, Samuel Guedes e muita gente boa que o Projeto Armazém botou na roda. E a família? Muita colaboração neste sentido.
E a vida e o turbulento cotidiano? Bah, nem me fale. As 18 pessoas investigadas pela Operação CONCUTARE, da Polícia Federal foram detidas e conduzidas ao pavilhão que acolhe presos temporários, com ensino superior e/ou aqueles servidores da Justiça já condenados. Totalizaram naqueles dias quase 50 pessoas nestas condições de detenção. Num universo de quase 4.500 presos, onde a maioria da população é negra ou não branca. Fiquei chocado!! Ou melhor, como diz na canção Haiti, do Gil e do Caetano  "os quase pretos ou os brancos quase pretos"... Não é moleza, o negócio!
           Na semana passada participei de uma qualificação (Curso de extensão idealizado pelo DEDs/UFRGS- Lideranças negras e identidades étnicas no RS) onde foram discutidos temas pertinentes e fundamentais a boas reflexões sobre o tema. Dentre as participações do primeiro dia, destaca-se a participação do professora, doutora no tema - Elisa Nascimento, conversando sobre a trajetória do Abdias do Nascimento (o autor do texto abaixo).
         Então...é tratamento diferenciado no futebol, na música, nas artes, na cultura, no mercado de trabalho, nas escolas, na VIDA. Xô, RACISMO!!
Beijos a todos.

Edinho Silva



Abdias Nascimento: 13 de maio uma mentira cívica
Publicado em Segunda, 13 Maio 2013

Fragmentos do discurso proferido pelo Senador Abdias Nascimento por ocasião dos 110 anos da Abolição no Senado Federal.
O SR. ABDIAS NASCIMENTO (Bloco/PDT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, sob a proteção de Olorum, inicio este meu pronunciamento.

Na data de hoje, 110 anos passados, a sociedade brasileira livrava-se de um problema que se tornava mais agudo com a proximidade do século XX, ao mesmo tempo em que criava condições para o estabelecimento das maiores questões com que continuamos a nos defrontar às vésperas do Terceiro Milênio. Assim, a 13 de Maio de 1888, a Princesa Isabel, então regente do trono em função do afastamento de seu pai, D. Pedro II, assinava a lei que extinguia a escravidão no Brasil, pondo fim a quatro séculos de exploração oficial da mão-de-obra de africanos e afro-descendentes nesta Nação, mais que qualquer outra, por eles construída.
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A tentativa de vender a abolição como produto da benevolência de uma princesa branca é parte de um quadro maior, que inclui outras fantasias, como a "colonização doce" - suave apelido do massacre perpetrado pelos portugueses na África e nas Américas - e o "lusotropicalismo", expressão que encerra a contribuição lusitana à construção de uma "civilização" tropical supostamente aberta e tolerante. Talvez do tipo daquela por eles edificada em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, quando a humilhação e a tortura foram amplamente usadas como formas de manter a dominação física e psicológica de europeus sobre africanos.

Na verdade, o processo que resultou na abolição da escravatura pouco tem a ver com as razões humanitárias - embora essas, é claro, também se fizessem presentes. O que de fato empurrou a Coroa imperial a libertar os escravos foram, em primeiro lugar, as forças econômicas subjacentes à Revolução Industrial, capitaneadas por uma Inglaterra ávida de mercados para os seus produtos manufaturados. Explicam-se desse modo as pressões exercidas pela Grã-Bretanha sobre o Governo brasileiro, especialmente no que tange à proibição do tráfico, que acabaria minando os próprios alicerces da instituição escravista. Outro fator fundamental foi o recrudescimento da resistência negra, traduzido no pipocar de revoltas sangrentas, com a queima de engenhos e a destruição de fazendas, que se multiplicaram nas últimas décadas do século XIX, aumentando o custo e impossibilitando a manutenção do sistema.
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Em entrevista publicada semana passada pela revista Veja, em que se discute a situação dos negros neste País, o Presidente Fernando Henrique Cardoso disse não ser contrário ao sistema de quotas, forma mais incisiva de ação compensatória, que constitui a essência do meu projeto de lei. O Presidente foi além dessa declaração e afirmou literalmente: "Havendo duas pessoas em condições iguais para nomear para determinado cargo, sendo uma negra, eu nomearia a negra". Como é curioso, para dizer o mínimo, observar correligionários do Presidente aqui no Senado manifestando idéias e atitudes absolutamente contrárias às de seu suposto líder e utilizando, para isso, todo um arsenal de argumentos ou intempestivos, ou equivocados, ou desinformados - pois não quero acreditar que sejam maliciosos.
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Assim, neste 13 de Maio, fazemo-nos presentes nesta tribuna, não para comemorar, mas para denunciar uma vez mais a mentira cívica que essa data representa, parte central de uma estratégia mais ampla, elaborada com a finalidade de manter os negros no lugar que eles dizem ser o nosso. A comunidade afro-brasileira, porém, já mostrou claramente que não mais aceita a condição que nos querem impingir. Mais uma prova disso foi dada na madrugada de hoje, quando o Instituto do Negro Padre Batista, juntamente com dezenas de outras organizações, realizou em São Paulo a segunda Marcha pela Democracia Racial, desfraldando a bandeira da igualdade de oportunidades para os afro-descendentes. Assim, ao mesmo tempo em que denuncia as injustiças de que é vítima, nossa comunidade apresenta reivindicações consistentes e viáveis para a solução dos seculares problemas que enfrenta. Reivindicações, como a ação compensatória, capazes de contribuir para que venhamos a concretizar, com o apoio de nossos aliados sinceros, a segunda e verdadeira abolição.

Sr. Presidente, pulei vários trechos para abreviar meu pronunciamento, solicito que a publicação seja feita na íntegra.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
Axé!

Querem ler o texto na íntegra?? Acessem http://www.geledes.org.br/atlantico-negro/afrobrasileiros/abdias-do-nascimento/18687-abdias-nascimento-13-de-maio-uma-mentira-civica