14 de abr. de 2021

Saudade dói....Coisa doida, não? - Um pouco de "Samba do cachorro" por Zé do banjo

 

https://www.youtube.com/watch?v=NmUWM1oqQ9k


      Era do José Carlos de Oliveira - o Zé do Banjo, dos inesquecíveis Samba do Andaraí e Samba do Cachorro, duas rodas de samba ao ar livre que Porto Alegre conhece nos tempos em que era reconhecida como Cidade Sorriso.

       Hoje tá brabo...é Cidade das lágrimas...Putz!!! Mas de tristeza já estamos cansados. Quero escrever aqui na conta do Samba do Cachorro, onde o inquieto Ciriaco "o Cachorro" recebia os sambistas de todas as idades, sexo, classe social, cor da mesma forma. 

      Nossa Cidade não tem mais isso....Rodas de samba ao ar livre?? Para que?? Juntar gente, cheiro de urina, latas e lixos espalhados. Insegurança nas ruas. Quem disse que era isso?? Quem discriminava e sempre estigmatizou o samba, seja com comentários preconceituosos, intolerantes e racistas.

    Descrever as coisas positivas que estes movimentos populares sociais oferecem é a coisa mais simples. Antes da "Pandemia" e do distanciamento social pegávamos nossos trocados e caimos dentro da CVC para comprar passagens para ir ao Rio de Janeiro, visitar as praias e as rodas de samba ao ar livre. E quem disse que Porto Alegre não tem EXCELENTES MÚSICOS, homens e mulhres,  com seus cavacos, seus violões, instrumentos percussivos, seus dançantes e cantantes. Temos espaços locais muito aprazíveis para tais ações.

    "Tá, Edinho...e o charme do Cacique de ramos e sua tamarineira?? O samba do trabalhador e o Moacyr Luz?? A pedra do Sal?? O chopp gelado e o bolinho de feijoada?? " Eu insisto...é só não "arrochar" nos impostos para a cerveja não ir para as nuvens. 

        Parece difícil?? Nada. A preconceituosa Porto Alegre é que não descobriu ou não quer...

    Em breve, o Samuka Guedes "nas coisas do Armazém" para nos contar um pouco da História do Pagode do  Andarai.

        Zé...to com muita saudades tuas, meu chapa

"O avesso da pele" o recado do Jeferson Tenório, o patrono da Feira do Livro - "Outras palavras" por Michele Moura

 

Patrono da Feira do Livro de Porto Alegre 2020

        Satisfação, amigos e amigas do Armazém! Hoje as Outras Palavras de que falaremos são sobre o romance “O  avesso da pele”, de Jefferson Tenório, esse autor que até pode ter nascido no Rio de Janeiro, mas é nosso aqui: veio aos treze anos pra Porto Alegre e vive aqui até hoje.

        Tenório nunca tinha imaginado entrar numa universidade,até que, aos 18 anos, ao voltar de  madrugada da pizzaria em que ele  trabalhava, foi abordado violentamente pela policia. Só que aquela não era  a  primeira vez, e nem seria a última vez que aquilo aconteceria. A cor da pele dele o tornava um suspeito nas ruas por onde ele passava. Então queria mudar de vida, aquilo não era mais para ele, como dizia a sua mãe “quanto menos você se mostrar na rua, melhor”. El ajá sabia o que o esperava. 

         O Escritor , portanto, foi cursar uma faculdade particular, mas  se deu conta de que  estava muuuuito abaixo intelectualmente dos outros colegas, que falavam fluentemente sobre Shakespeare, sobre Homero e sobre outros cânones que ele nunca tinha ouvido falar. (Inacreditável, não é? Mas no início foi assim). Obsessivamente, então, começou a comprar livros, só que ele começou a gostar tanto, e comprar tanto, que já não tinha como pagar a faculdade. Então ele fechou a matricula e estudou para entrar na UFRGS, onde anos depois se graduou, e hoje conclui o Doutorado em Teoria Literária pela PUC/RS.

            Hoje ele também  é professor de Literatura e tem somente 5.000 exemplares na sua biblioteca. Invejinha aqui desta humilde professora da rede pública estadual, porque o Educado Leite não colabora! (Urghhh!!!)

            Um dos libros que moldou a sua carreira como escritor, foi “Quarto de despejo”, da Carolina Maria de Jesus, que não coincidentemente falamos no programa de domingo passado.  Seu último romance “O Avesso da Pele” se passa em uma Porto Alegre cheia de contraste, como qualquer capital brasileira. 

            O personagem Pedro, após a morte do pai que foi assassinado numa abordagem policial, sai em busca de resgatar o passado da familia, refazer os caminhos paternos, e buscar reconstruir a sua própria identidade. E nisso, Tenório consegue mostrar  um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, que a gente percebe nas tantas vezes que o personagem Pedro menciona as aulas que o pai dava na escola pública. 

            Uma das passagens mais marcantes do livro é quando o Pedro relembra que o pai já tinha sofrido muitas abordagens policiais durante a vida. Uma delas quando muito jovem, foi quando o pai (Henrique) fez amizade com um amigo que morava num bairro de classe alta de Porto Alegre. E enquanto esperava o amigo do lado de fora do prédio, um policial o abordou. E a narração diz assim: 

            “Ao chegar, você apertou a campainha e esperou. Pessoas passavam por você na rua e te olhavam. Ninguém respondeu no interfone. (…) Decidiu ficar ali na frente do prédio e pensou que ele poderia ter saído com a mãe dele.        

             No entanto, em minutos, surgiu o policial da Brigada Militar ao seu lado dizendo para você circular que ali não era lugar para pedir coisas”. (Essa história, infelizmente, também a gente já conhece).

          “O avesso da pele” não é uma leitura fácil, porque ela dói demais. Em mim ela dói de saber que tem pessoas que sofrem isso diariamente. Mas eu nunca vou conseguir calcular sequer minimamente a dor que carrega quem tem que estar sempre explicando a sua cor, o seu cabelo, e as suas dores. E essa leitura doída, acho que por ser tao dolorida assim, nos ensina muito… acho que a gente aprende muito pela dor, pelo sofrimento, infelizmente! 

            A gente aprende pelo impacto que a gente sofre com determinadas coisas. Então nao posso dizer que é uma leitura fácil, mas é uma leitura que deslancha, que tem uma linguagem super acessível para qualquer leitor.

           Importante dizer que , por muitas e muitas vezes, o narrador menciona um professor do pai na universidade, e o professor nada mais é do que Oliveira Silveira. E foi ele quem fez com que o personagem do pai reconhecesse que era um negro num lugar onde se morre pela cor da sua pele. E é do Oliveira Silveira que a gente vai falar domingo que vem. Não perde, hein? Te espero aqui. Beijo e até lá!!

Michele Moura - Professora de Literatura, Formada em Letras pela FURG, Especialista em Literatura Brasileira com ênfase em Literatura Comparada(UFRGS). Professora de Língua Espanhola e Literatura na rede pública. Membro da Coordenação do Atelie 1 e do Clube de Cultura e Comunicação Planalto.;

 

Nery Caveira - o mestre dos mestres por Fernando Batista - Quadro do Armazém do seu Brasil - "Mesa de diretoria"

 

Imagem meramente ilustrativa - surdo de bateria
    
                                                                            

Olá amigos e amigas/

        Aqui é Fernando Baptista e este é o Mesa de Diretoria, uma mesa diversa, sem preconceitos, musical e repleta de histórias aqui no Armazém do Seu Brasil.

            E hoje eu trago para vcs, na estreia deste espaço, um pouco da história de um grande diretor de bateria, mestre de bateria. Mas muito mais do que isto. Um ícone da percussão no nosso Estado, do nosso carnaval, da música regional e até dos festivais nativistas.

            Falo de Nery Soares Gonçalves, o mestre Neri Caveira, nascido e criado no Areal da Baronesa, berço do samba gaúcho em Porto Alegre.

            Afilhado do irmão de Lupicinio Rodrigues, agraciado com o Prêmio Açorianos de Música pelo CD Três Percussionistas em 1997, Neri introduziu breques até então inexistentes nas baterias das escolas de samba do sul do país.

            Estudioso, em paralelo ao seu trabalho a frente da bateria de Imperadores de Samba, onde foi imortalizado, desfilou seu conhecimento, o sorriso aberto, as suas influências musicais e rítmicas pelos palcos dos festivais nativistas quebrando paradigmas e vencendo preconceitos.

            Em um deles, que o recebeu de braços abertos, A Moenda da Canção, de Santo Antônio da Patrulha, Neri tocou por diversas vezes com Loma, uma das divas da canção do Rio Grande do Sul.

            E lá residiu, marcou época e talvez tenha tido a maior homenagem que poderia receber: é nome do troféu dado ao melhor percussionista da Moenda Instrumental, que ocorre junto da Moenda da Canção desde 2011. Fica a dica, depois que tudo isso passar, que os abraços voltarem, vá até Santo Antônio da Patrulha e confira a Moenda. Você não vai se arrepender.

            Voltando a Porto Alegre, após este rápido passeio a Santo Antônio Patrulha, Neri gravou cd´s com Neto Fagundes, Nelson Coelho de Castro e própria Loma. Dividiu o palco com Renato Borghett e colocou a bateria dos Imperadores junto com orquestra da OSPA, unindo o erudito e o popular.

            Lá estavam lado a lado, em igualdade de condições, os músicos da orquestra com seus violinos, flautas, violoncelos e oboés, e os músicos da escola de samba com caixas, tamborins, repiniques, maracanãs, regidos pelo mestre Neri Caveira. Vendo tudo isso, outro mestre percussão gaúcha, o pelotense e fundador da Academia de Samba Praiana, Giba Giba proferiu a célebre frase: isto não é uma bateria e sim uma sinfônica.

            Tempos depois Neri Caveira e sua Sinfônica estavam no palco sagrado do Teatro São Pedro. A cultura popular ocupava um espaço nobre, de pompa, provando sua força e importância.

            Neri nos deixou em janeiro de 2004, aos 67 anos. Mas deixou um legado e a sinfônica sob o comando de dois grandes discípulos seus: Sandro Brinco, que faleceu precocemente, e Sandro Gravador. Aliás, é impressionante a quantidade de talentosos e talentosas percussionistas que nosso Estado produz. Procure mais sobre Davi Batuka, Pedrinho Bozo, Mestre Cy, Ariel Espindola, Biba Meira, Mimo Ferreira, Mestre Guto, Cristiano Tutti Sagui, Luciana Melo, Bruno Coelho, Zé Evandro do Pandeiro, Zé da Terreira, Alexsandra Amaral, Luiz Jaka, veja a trajetória de Marcelo Pimentel, Giovani Berti, Richard Serraria. Projetos como Alabê Ôni, Turucutá e Tamborada. Reverencie os baluartes Giba Giba, Fernando do Ó e Mestre Nilton Pereira (Velha Guarda de Bambas da Orgia).

            Temos que lembrar que os tambores, reprimidos por muito tempo, foram muito mais que música. Foram sinônimo de resistência, rebeldia e um sopro de liberdade e esperança diante da sociedade escravocrata existente. E hoje de certa forma seguem sendo.

            E nada melhor do que encerrar este primeiro Mesa de Diretoria com a homenagem de Nelson Coelho de Castro cantando “Mestre Neri”, de sua autoria, que está no CD “Da Pessoa”.

            Siga o Armazém do Seu Brasil nas redes sociais e até o próximo Mesa de Diretoria.

           Fernando Batista Maguari - jornalista, sambista, carnavalesco, estudioso das coisas do Brasil