27 de dez. de 2011

Um lombo diferente




           Na tarde que antecedia as comemorações do Revellion, o nego Claudinho chegou na casa da sogra todo animado com uma garrafa de uisque importado (comprou de um colega que viajou ao Paraguai), um livro de receitas e um punhado de temperos e especiarias direto do Mercado Público. O cara estava disposto a surpreender a todos na ceia do Ano Novo. Durante a vida toda, seu talento de "grand chef" limitava-se a preparar miojos e ovos fritos. Apenas isso. Agora a situação se modificara, pois com o novo livro e muita boa vontade tudo seria diferente. 
        Sem alertar muito e sem detalhar o que faria, pediu permissão para utilizar a cozinha e não ser importunado durante o preparo do prato. Como não havia providenciado os insumos, abriu a geladeira e foi logo pegando a primeira peça de carne que avistou - um belo lombo suíno. Assim começava a ser definido, o grande prato da noite: Lombo escocês com ervas finas. O nome e a receita constava na página 73, do livro de receitas internacionais, recentemente comprado.
                      As festas na casa do seu Orlandinho, o sogro, instrutor de defesa pessoal da Academia de Polícia, tinham uma característica cooperativada. Os convivas traziam um prato e o anfitrião oferecia as bebidas. O tradicional lombo de porco era preparado pela Dona Neusinha, sua mulher e sogra do Claudinho, pois seu tempero era famoso entre os amigos e familiares.  Naquele ano, sensível aos apelos do genro, sem contar ao marido, abriu mão da preparação do prato. "Tudo contigo, Claudinho. Não vá me desapontar, hein??" - anunciou a simpática senhora. "Prometo blindar a cozinha e impedir que alguém chegue perto" - finalizou.
            Livro aberto, forma untada, farofa pronta, carne sobre a bancada, temperos socados, um primeiro banho de uisque no bicho (a receita original previa gotas de conhaque, mas como o moço havia aberto a garrafa para experimentar o scott), cobertura na cabeça, avental e mãos à obra. Era meio copo de uisque no lombo suino, um copo com gelo no lombo do Claudinho e assim foi até o forno pré-aquecido ser utilizado para o devido assado.
             Após quase duas horas de cozimento e de muito cuidado por parte do zeloso Chef que, abria a cada 15 minutos o forno e banhava um pouco mais o lombinho com o molho especial e o uisque, foi concluído o prato. Bastava talvez, algum pequeno detalhe. O grande final,como diriam os entendidos do assunto. Logicamente, que o moço ficou bebericando o destilado sistematicamente. 
           Ao retirar do forno o lombo, muito bem temperado, porém ligeiramente endurecido(!), o Claudinho imaginou impôs um último toque pessoal. Olhou para a garrafa do Grand's e avistou um último copo da bebida. Sim, era Grand's numa garrafa de Grant's. Cobriu a carne com a bebida e tascou fogo buscando FLAMBAR o prato, conforme havia assistido num programa de televisão. A sugestão não constava na receita, mas o genro queria somar pontos com o sogrão. E o resultado?? Carne dura, tostada e queimada, uma cozinha enfumaçada e imunda, uma garrafa vazia, o livro com as páginas manchadas e o Claudinho falando um dialeto que até hoje ninguém entende. Para evitar a maior confusão, Dona Neusinha buscou socorro com a Tianinha e a Dona Morena que juntas prepararam às pressas outro tipo de carne suina para agradar o marido da amiga e salvar a pele do quase cozinheiro Claudinho. Enquanto as amigas preparavam o quitute, mãe e filha - Neusinha e Tinica, davam um banho de mangueira nos fundos da casa do seu Orlandinho. O agitado e bom garfo, policial campeão de luta livre. 

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